capitalismo e depressão

A depressão inclui sintomas como perda do sentido da vida, inibição, desesperança, sentimentos de vazio, infelicidade, um mal estar indefinível e generalizado, desinteresse pelo cuidado pessoal e por atividades que antes eram gratificantes, insônia ou hipersônia, fadiga ou perda de energia, dores de cabeça, transtornos alimentares, diminuição do desejo sexual, dificuldade de raciocínio e concentração, ansiedade, sentimentos de culpa, inutilidade e de um profundo e incontrolável sofrimento.

Atualmente, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais – DSM-5 (APA, 2014), a depressão é reconhecida como Transtorno Depressivo Maior, oriunda do grupo de transtornos depressivos.

Vivemos uma verdadeira epidemia permeada por insegurança e desamparo do sujeito frente a uma sociedade com crises econômicas, desemprego, fragilidade das figuras parentais e de autoridade, violência, miséria, drogas, guerras e revoluções, enfim, abarcando uma infinidade de fatores fortemente depressores e que denunciam as contradições da nossa cultura.

Com o novo modelo de organização social neoliberal, vai se instaurando uma cultura da produtividade. Isso não é novidade. Já estava presente no início da modernidade aquilo que o sociólogo alemão Max Weber chamou de “espírito do capitalismo”, que existia antes mesmo do capitalismo, mas que já foi se instaurando como um modo de vida. Com o neoliberalismo, isso é radicalmente intensificado. Há uma cultura cada vez mais centrada na ideia de performance, desempenho e competição. Colocando a responsabilidade no indivíduo como único responsável pelo seu destino social. No capitalismo contemporâneo, a principal matéria-prima para gerar valor é a dimensão cognitiva, a capacidade de criação, a inteligência. Esse foco na saúde mental pode funcionar como uma estratégia para não desperdiçar essa matéria-prima, para que se possa investir sobre ela, sobre o capital humano. Aí temos um modelo de vida social que intensifica o sofrimento psíquico, mas também uma difusão dos cuidados com a saúde mental a nível individual: meditação, ioga, exercícios físicos, qualidade de vida e sono. Desse modo, não temos nenhuma mudança de paradigma para tratar a saúde mental.

Em uma sociedade imediatista e extenuante, “os depressivos, além de se sentirem na contramão de seu tempo, veem sua solidão agravar-se em função do desprestígio social de sua tristeza” (KEHL, 2009, p. 21).

Destarte, Han (2017) problematiza a existência de uma relação direta entre os quadros de sofrimento na sociedade contemporânea com o modo de operar do capitalismo. Isso se traduz, para o autor, pelo excesso de positividade de nosso tempo, por meio do qual não haveria modo, tempo e lugar para se pensar a subjetividade humana, sobretudo o esgotamento típico dos sofrimentos psíquicos de nossa época.

A responsabilidade por uma saúde mental positiva recai quase sempre sobre o ombro do indivíduo, que precisa se cuidar, seja com a prática de exercícios, como ioga ou esportes, ou com um acompanhamento médico constante. “Tivemos um boom na economia do autocuidado, de coaching, de medicina de bem-estar, tudo para que possamos gerenciar muito bem a nossa saúde mental. É paradoxal porque, se a incidência é cada vez maior, considerando a forma de organização social, existe, por outro lado, a exigência de se administrar apenas individualmente o problema.”

O consumo de psicofármacos, instabilidade mental, ansiedade, depressão, intolerância ao sofrimento, frustração e estresse no trabalho são consequências de tudo isso. Muitas vezes, essa situação se condensa em um círculo vicioso, quando a patologia produz exclusão social acompanhada de desespero, medo e pode levar à autoagressão e até suicídio.

Os aparatos ideológicos do sistema constroem um ideal de desejo exigente e insaciável, ao passo que, através dos anos, especialmente com o avanço neoliberal, se reduziu o padrão de vida dos trabalhadores e se condenou a juventude à precarização no trabalho. O consumo de psicofármacos, instabilidade mental, ansiedade, depressão, intolerância ao sofrimento, frustração e estresse no trabalho são consequências de tudo isso.

Existe um mandato de felicidade construído dentro do capitalismo neoliberal, no qual a felicidade é alcançada apenas a partir da individualidade. Um mandato de felicidade irrealizável, fantasioso e meritocrático, que pode responder aos ideais burgueses (ter casa, filhos, corpo e relações perfeitas, carro e cachorro) ou a uma fantasia pós-moderna de felicidade fora da sociedade (viver sozinho na montanha e cultivar sua comida).

Quebrar os mitos negacionistas implica aceitar que o problema existe e ver como deve ser analisado na perspectiva classista.

Portanto, os problemas de saúde mental não são estranhos ao sistema, pelo contrário, são característicos dele, são sistêmicos. Vivemos em um sistema excludente, como consequência, as medidas de atenção e contenção dessas patologias também são excludentes: o acesso ao atendimento psicológico, tratamentos adequados, incluindo as hospitalizações, são estratificados como em todo o sistema de saúde em geral.

Esses problemas afetam especialmente os setores populares, a juventude e os trabalhadores. Portanto, devem ser abordados como tal, sem negacionismo, nem infantilismos. 

Há um longo caminho a percorrer. É necessária uma abordagem classista da saúde mental, que permita uma visão integral sobre a problemática. O capitalismo gera sofrimento e nega as possibilidades de tratá-los adequadamente. Será necessário alcançar uma sociedade mais justa, onde a saúde e o bem-estar sejam verdadeiramente direitos universais.

Sobre Butterfly

gosto de temas espirituais, místicos/esótericos, políticos, sociais, direitos humanos, educacionais, psicológicos/ filosóficos e tudo que acrescente a alma.
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